segunda-feira, 25 de julho de 2011

Um cheiro gostoso de flor



Um cheiro gostoso de flor

O dia nublado clareou e lá está ela, uma rosa solitária que adora tomar banho de chuva abrindo suas pétalas em um jardim rodeado de margaridas.

A linda rosa vermelha poderia se sentir melhor que as outras moradoras daquele jardim, porém seu verdadeiro sentimento é de amor e por estar apaixonada sua cor é vermelha. Às vezes ela pensa que seria melhor ser uma rosa amarela misturando-se às belas margaridas já douradas com suas pétalas queimadas pelos raios ardentes do sol, tanto que ela apenas queria viver feliz no meio daquelas lindas margaridas espalhadas pelo canteiro e se espalhar também sem ser notada formando uma sociedade ocasionalmente estabelecida pelas mãos da vida.

As passadas medrosas nos caminhos secretos do subconsciente, ocasionalmente nos encorajam a sair do nosso modo cotidiano e aprisionado de viver rompendo o labirinto dos ideais e naufragando profundamente no desejo da felicidade.

Toda vez que abro a porta do sonho sou capaz de enxergar a liberdade e saborear o gosto doce de ser feliz, nesse desejo é que invado seu jardim e partilho o meu sonho com o seu. Atravesso a porta e sinto o vento tocar o meu rosto como se fosse as suas mãos, agitando os meus cabelos e me convidando a correr na fantasia em devaneios absolutamente distante do real.

O grande jardim é onde sempre começamos a sonhar. Coloco meus olhos no sonho e já a avisto de vermelho no meio daquela onda de flores ao vento, envolvida na cor dominante do amor.

Colho a rosa vermelha que está no meio do jardim e corro para você, nela está o poder do nosso desejo, uma rosa para a minha estrela vermelha que faz de mim seu grande caçador, pois brilhando em meu sonho ela me ensinou a sonhar, brincar, voar e amar, fazendo meus olhos brilharem.

Sou um escravo da arte, um eterno apaixonado pelas formas do corpo, dos relevos dos seios, da cor dos olhos, da felicidade no sorriso e da beleza proporcionada pela alegria que vem de dentro quando se está amando.

O canto da minha sonhadora me convida a sonhar. Um canto de uma menina que vem de longe, um canto misterioso e gostoso de amor que vem me buscar como o canto de uma sereia das flores, navegante de um lindo jardim de sonhos onde encontro ela a me esperar.

- Bom dia menina linda! Eu trouxe um morango vermelhinho para você saborear. Sinta o prazer dessa fruta do amor que traz o formato do coração, ela é capaz de alegrar o seu dia e deixar esse seu cheirinho de flor muito mais gostoso.

- Você sempre me traz flores e hoje trouxe um morango tão lindo e saboroso quanto o nosso sonho. Quando não te encontro sou devorada pela saudade, fico escrava e presa na solidão que só acalma caminhando no meio desse jardim de flores, apenas consolada pela toada de uma música doce. Eu adoro ganhar flores!

Entro no seu sonho e você está linda com os olhos pequenininhos de sono. Será que você ficará feliz com esse morango tão pequenininho de presente? E se você não estiver pensando em mim!

Imediatamente ouço seu grito me chamando na estrada, correndo em minha direção, me agarrando, caminhando, namorando, voando, voando, voando.

A menina dos meus olhos refletida no meu olhar, no meu pensar e que não me deixa raciocinar, pois não tem medo de nada e permanece sentada na mesma estrada sabendo que eu vou voltar. Ela é a menina de olhos castanhos do sonho de um contador de histórias. Ele sabe que ela estará sempre esperando no mesmo lugar, por isso traz uma flor amarela para enfeitar o cabelo dela.

Chega um momento em que tudo fica quieto, silencioso e sem ação e ela fala:

- Você não entende! Eu sou uma menina flor, bela, silenciosa, linda, atraente e carrego comigo o dom do amor. Estou sempre te esperando no nosso caminho mágico com um cheiro gostoso de flor, enquanto você não vem escrevo poesias de amor.

As águas selvagens de um rio invadem o nosso mundo dizendo que é hora de ir, logo a frente há uma bifurcação que não entende o nosso coração, agita o nosso sonho e não nos deixa sonhar. Por favor, não me acorde! Volte para o meu sonho e deixe-me sentir seu cheiro gostoso de flor novamente.


ZziperR
Paulo Ribeiro de Alvarenga

domingo, 17 de julho de 2011

Uma caixinha de surpresas



Uma caixinha de surpresas

O estresse dessa rotina cotidiana nos deixa cansado, por isso no fim de semana resolvi passear sem destino pelas ruas da cidade, dirigindo em velocidade cadenciada, quero ser um observador dos detalhes arquitetônicos da cidade.

Tantas árvores decoram a avenida e perto do aeroporto um grande avião parecia que ia cair sobre mim, mas continuei mesmo assim. Contornei uma grande ponte toda raiada que a Globo insiste em mostrar e quando parei no farol, que o passeio realmente começou a me interessar.

Uma grande tenda foi montada para chamar a atenção e ninguém se interessava em olhar, porém o farol ficou vermelho e eu tive que parar. Várias pessoas com caixinhas estranhas na mão caminhavam até os carros e pareciam fazer mágicas para as pessoas, porém distante eu não conseguia entender.

Entre eles havia uma garotinha com uma caixinha marrom na mão que correu até mim, fiquei curioso para saber que mágica ela ia fazer, então entreguei toda a minha atenção a ela que falou:

- Você quer ver a minha caixinha de surpresa?

- Quero!

- Tome! Pega ela e abre.

Abri a caixinha e não tinha nada, mas quando retornei meu olhar para a garotinha, ela tinha se transformado e estava com o rosto todo maquiado e pintado instantaneamente como uma palhacinha.

- Como você fez isto?

- É segredo! Quer uma surpresa muito maior?

- Quero!

- Então me devolve a caixinha!

Ela virou de costas para mim, abriu a caixinha, assoprou dentro dela, depois fechou e entregou outra vez em minha mão. Abri novamente a caixinha e não tinha nada dentro. Olhei novamente para a garotinha e nada tinha mudado, pois ela continuava com o rostinho pintado de palhacinha, então falei:

- Sua mágica falhou! Nada aconteceu!

- Você tem certeza! Então olha o seu rosto.

Eu olhei no espelho do carro e não acreditei no que vi. Meu rosto estava pintado com uma maquiagem que expressava a figura de um palhaço feliz.

Você fez as suas surpresas. Agora é a minha vez! Estacionei o carro. Tirei um sapo manuseado por cordões e participei com ela naquela festa da arte.
Ela corria no meio dos carros na frente, enquanto eu a seguia com o meu sapo pulando e fazendo Ploc! Ploc! Sempre atrás dela, até a festa acabar. Ela fazia mágicas com sua caixinha enquanto meu sapo pulava na cabeça dela. Ela ria e ele pulava nos ombros dela, depois pulava no teto do carro e via sua impressionante habilidade de realizar mágica.

A noite chegou e toda aquela brincadeira maravilhosa da arte acabou. Até hoje não sei se a mágica estava na caixinha ou nas mãos daquela menininha, só sei que a festa terminou. A grande tenda foi desmontada e todos os artistas se despediram e foram embora levando na bagagem seus segredos.

Na hora da despedida resolvi lhe fazer uma última surpresa. Ajoelhei na frente dela para ficar da mesma altura porque ela era pequenininha e falei:

- O sapo chorão está chorando porque ele quer ir embora com você. Leve ele para você caixinha de surpresa! Ela agarrou o sapo com tanto amor, abraçou e apertou, depois falou:

- Eu também vou te fazer uma última surpresa! Ela virou de costas para mim, assoprou na caixinha, depois fechou, virou e me entregou.

Imediatamente eu abri a caixinha e nada aconteceu. Tudo estava praticamente igual, nada mudou. Ela falou: Adeus Ziii! Depois foi embora correndo com o sapo chorão nos braços para o carro dos pais, me deixando com a caixinha mágica de surpresa na mão.

Fiquei surpreso, pois não aconteceu nada e eu fui o último a sair do local. Porém quando eu entrei no meu carro e olhei no espelho tive outra grande surpresa, pois meu rosto voltara ao normal. A pintura de palhaço havia sumido, dando a impressão de que eu estava mergulhado em um sonho e nada havia acontecido, porém eu continuava com a caixinha de surpresas na minha mão.

Eu nunca consegui fazer uma mágica com aquela caixinha, mas a guardo com carinho, pois com certeza tem alguma surpresa escondida dentro dela.

Fui embora seguindo por aquela grande ponte iluminada e pensando: Que surpresa feliz!

ZzipperR
Paulo Ribeiro de Alvarenga

sábado, 9 de julho de 2011

Um palhaço com olhos de vidro e o gato preto





Um palhaço com olhos de vidro e o gato preto


Na madrugada gelada, as gotas frias do sereno trazidas pelo vento batem no rosto daquele andarilho solitário que procura um abrigo para dormir. Ele já caminha com dificuldade por sentir dores nos pés congelados e o vento cortando seu corpo causa calafrios momentâneos que o fazem tremer. As gotas geladas misturadas ao vento frio parecem queimar a pele daquele caminhante solitário da rua deserta.

O asfalto molhado começa a ficar perigoso, então ele caminha com cuidado para não escorregar, pois há poucas luzes acesas, isso deixa a visão turva e enganosa.

De repente um gato preto cruza o seu caminho e ele para por ser extremamente supersticioso. Agora ele ficou com receio de continuar a caminhada por essa rua, pois pode trazer azar e se tornar perigoso, então resolveu mudar o caminho. Entrou em outra rua, a qual também estava totalmente deserta e continuou caminhando com dificuldades.

A solidão da noite fazia qualquer movimento parecer assustador e no meio da neblina misturada ao sereno ele avistou uma pessoa sentada na calçada. Foi um momento que o deixou confuso entre desconfiança e medo, porém não tinha como voltar atrás, então ele continuou caminhando com o olhar atento aos movimentos da pessoa que estava sentada na calçada.
À medida que ele ia se aproximando, percebia que havia alguma coisa estranha naquela pessoa, que agora parecia ser uma criança. O homem parou, olhou com mais atenção e percebeu que a pessoa também olhava para ele, mas parecia um olhar vitrificado de alguém que não tinha vida.

Aquele olhar refletindo a iluminação da rua parecia ser de vidro, esse brilho fazia com que a curiosidade tomasse o lugar do medo, então ele resolveu chegar mais perto. Agora não parece mais uma pessoa e sim um boneco que alguém deve ter abandonado na rua.

O andarilho se aproximava olhando para o boneco enquanto o boneco também olhava para ele. Mais perto e ele percebeu que o boneco era um palhaço de olhos de vidro, porém ao chegar bem próximo um movimento brusco no corpo do palhaço lhe deu o maior susto, um gato preto saltou do colo do boneco e saiu correndo.

Ao ver o gato pular e correr, o homem supersticioso ficou amedrontado e hesitou em continuar, não sabia o que fazer e caminhou em volta do boneco que parecia acompanhá-lo com o olhar.
Confuso com tudo que estava acontecendo, a razão superou o medo e ele se aproximou do palhaço, pegando-o em seus braços, mesmo sendo um boneco com olhos de vidro, seu olhar parecia real e delator de algumas vontades quase impossíveis.

Ele olhava nos olhos de vidro do palhaço e o palhaço olhava nos seus olhos cansados, depois colocou o boneco embaixo do braço e continuou caminhando vagarosamente com os dedos dos pés doendo e duros de frio. Foi nesse momento que ele escutou:

- Você está me machucando!

O andarilho olhou para trás e não viu ninguém, então imaginou ter ouvido coisas. Balançou a cabeça como se estivesse ouvindo coisas sem sentido e continuou caminhando, porém ouviu novamente:

- Você está me machucando!

O homem olhou para o boneco e falou para si mesmo já que não havia mais ninguém naquele local: Preciso descansar. Já estou ouvindo coisas!

E o boneco respondeu:

- Precisa mesmo. Você está um lixo.

O homem olhou atentamente para o boneco, bem próximo daquele palhaço de olhos de vidro e perguntou:

- Quem é você? Quem o abandonou naquela calçada?

- Eu sou a encruzilhada da vida. Sou do mundo de vidro e necessito de um coração ao lado para poder viver e quem me abandonou naquele lugar foi uma pessoa que perdeu o calor do coração.

Ambos admiravam o rosto um do outro. O homem com um olhar cansado observava cada detalhe da pintura de palhaço feita por alguém no rosto daquele boneco, aqueles olhos de vidro que pareciam vivos. Por outro ângulo o boneco estudava faceiramente o rosto cansado daquele homem aparentemente abandonado, barbudo, despenteado, sujo, porém com uma expressão facial de bondade, o boneco percebera nele um coração bom. Seria uma presa fácil.

O homem imaginou que estava sonhando, pois o sonho é como uma caixinha de surpresa que sai do meio de um nevoeiro de imaginações, vontades, desejos e nos transporta para um real imaginário onde temos a sensação de que realmente aconteceu, pois um sonho bem sonhado nos deixa com um sorriso satisfeito de felicidade e com uma vontade louca de sonhar mais, porém como poderia ser um sonho se ele estava frente a frente com aquele palhaço de olhos de vidro. A não ser que fosse um pesadelo. Ele olhou para o boneco e perguntou:

- O que eu faço agora?

- Me leva com você. Ajude-me a viver!

O homem caminhava no meio da neblina fria com o palhaço nos braços e percebia que era seguido pelo gato preto. De repente parou e tentou espantar o bichano.

- Some gato preto! Você traz azar, me dá calafrios e pressentimentos ruins.

O palhaço falou:

- Não é um gato. É uma gata e ela me acompanha aonde eu for. Nosso destino é ficar juntos e foi ela que o trouxe para mim.

O palhaço apontou para um beco escuro, abandonado e falou:

- Aquele é um ótimo lugar para passarmos a noite.

- Naquele beco escuro!

- Pode confiar em mim! Aquele é um abrigo seguro.

O medo às vezes faz o escuro se transformar em um monstro assustador, porém a rua deserta parece não ter fim já que as energias se esgotaram. As pernas não obedecem mais e doem, os pés congelaram, então é melhor descansar naquele beco escuro do que cair na calçada fria e morrer congelado sem forças para reagir.

Ao entrar no beco o andarilho encontrou algumas madeiras secas e acendeu uma fogueira, depois se acomodou no calor do fogo e foi lentamente sendo consumido pelo cansaço e o sono, até que o palhaço falou:

- Você não pode dormir. Tem que ficar acordado. Eu dependo de você para viver, se você dormir, eu morro.

O brilho do fogo, o calor abraçando e convidando para dormir, os olhos de vidro do palhaço refletindo as labaredas e a suplica de suas palavras num pedido de socorro, pedindo o quase impossível para alguém que passara tanto frio. No escuro o brilho dos olhos da gata.

- Eu não consigo ficar acordado!

O fogo aquecendo. O palhaço implorando e os olhos se aproximando.

O homem fecha os olhos se despedindo da vida. O palhaço entra em pânico tentando sobreviver, mas não escuta mais o coração bater e nos seus olhos de vidro o reflexo das patas da gata arranhando.

O dia clareou e da fogueira sobrou só as cinzas, Deitado e com marcas de garras no rosto o homem continua a dormir seu sono eterno com os olhos vitrificados. O palhaço sumiu daquele local levado pela gata ciumenta.

Quando a noite voltar, a gata trará outro coração para que os olhos de vidro do palhaço brilhem novamente, porém sempre ao alcance das suas garras.

ZzipperR
Paulo Ribeiro de Alvarenga