sábado, 30 de outubro de 2010

Uma adaptacão da lenda "O corpo seco"


Uma adaptação da lenda “O Corpo seco”

Depois de tanto tempo passado parece até que fiz parte dessa lenda, a qual se fez presente na comparação de muitas histórias pelo meu pai e o meu tio causando certa curiosidade e sensação de pavor ao ouvi-la.

O clima da história parece rolar num outono sem fim, pois os caminhos ficavam cobertos de folhas secas e nas passadas das pessoas o som dos estalos de gravetos quebrando penetravam no coração da alma causando calafrios e fazendo arrepiar.

Vamos esquecer o presente e mergulhar na lenda que se passou num passado distante: Tudo aconteceu numa cidadezinha do interior, onde a simplicidade das pessoas fazia parte de uma boa receptividade, porém entre tantas pessoas boas o mau se fazia presente.

Não dá para dizer que faltou amor àquele homem, pois o amor da mãe dele estava presente a todo o momento, o que torna incompreensível tanto ódio e desprezo às pessoas. Fazer maldades para aquele homem era um prazer, não ter piedade dos outros um princípio e para isso não poupava nem a própria mãe, que parecia ser odiada por ele. Quem passava naquele caminho silencioso em que se ouvia o canto maravilhoso dos pássaros, também ouvia o choro quase calado daquela mãe judiada, que apanhava constantemente daquele ser monstruoso e malvado.

Os moradores da cidade tinham dúvidas se no corpo daquele homem desumano havia um coração e se havia estaria nos poderes do demônio, porém o futuro prova que não estava, pois o demônio de tanto ser desafiado por ele, também não o queria no inferno.

O único capaz de enfrentá-lo foi o tempo, que passava lentamente e com toda tranquilidade tirava tudo o que ele possuía. O tempo cauteloso levou o seu pai, também levou a mãe que ele tanto judiava e por fim tirou dele a vida.

Deus se negou a recebê-lo no céu. O demônio não o aceitou no inferno e a terra se negou a recebê-lo expulsando-o da cova. Tentaram enterrá-lo várias vezes, mas não adiantou, pois ele sempre voltava para infernizar a vida das pessoas.

Abandonado pelo mundo ele passou a viver agarrado às árvores, que não resistiam ao seu abraço mortal e também secaram. Desta maneira ele se mantinha camuflado em caminhos desertos esperando alguma pessoa passar desprevinida para atacá-la e sugar o sangue, se não aparecesse ninguém para socorrer a vítima. Ele a sugava até a morte.

Abandonado pelo mundo seu destino foi vagar assombrando a vida das pessoas, tornando um pesadelo caminhar em trilhas no meio da mata, pois a sensação de medo proporciona um calafrio de temor dando a impressão de que está sendo seguido e será atacado a qualquer momento. Nem o tempo conseguiu vencê-lo, pois ele se tornou uma lenda. Até hoje ele é temido nas trilhas e entre as árvores no meio da mata.

Uma adaptação da lenda “O corpo seco”
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Paulo Ribeiro de Alvarenga

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Acreditar ou não?


Acreditar ou não?

Ele caminhava manuseando seu boneco pela praça acompanhado pela menina de vestidinho amarelinho estampado com frutinhas, para atiçá-la e deixá-la furiosa ele agarrava a perna dela com o boneco, aquela encenação de atrito carinhoso os aproximava cada vez mais e ela gostava tanto que até conversava com o boneco como se ele entendesse o que ela falava. O boneco tinha o mesmo nome do menino, então resolveram mudar o nome do boneco. Eles pensaram olhando para as ondas escuras do mar noturno e não conseguiram encontrar um nome apropriado que realmente se identificasse à personalidade do boneco.

Foram até o farol caminhando pelas pedras e olhando os caranguejos tentando se esconder, foi nesse momento que ouviram uma música distante que os deixou encantados, então resolveram conferir de perto correndo pela areia da praia até a praça e de longe já avistavam de onde vinha a música. Sem carregar o boneco a menina corria mais rápido que ele chegando primeiro ao local.

Os dois chegaram cansados e o garoto colocou o boneco no chão manuseando-o automaticamente, enquanto a menina o abraçava por trás e seus olhos ficaram arregalados e impressionados com a figura do realejo, no qual um homem tocava música girando uma manivela e um papagaio tirava a sorte das pessoas em pequenos papéis coloridos.

O garoto admirava a habilidade do homem se comunicando com o pássaro que parecia compreender repetindo tudo o que ele falava.

A menina agarradinha nele encostou-se ao seu ouvido e perguntou cochichando bem baixinho. Ele sentiu como se fosse o homem e o papagaio conversando numa compreensão além da amizade, então escutou ela perguntar:

- Você acredita que o papagaio adivinha nossa sorte?

Ele deu uma pequena virada para responder e sentiu a sua boca encostar-se à boca dela e respondeu:

- Eu acredito! Ela falou:

- Eu não acredito!

O menino se aproximou do homem do realejo e perguntou:

- O papagaio pode tirar a minha sorte?

O papagaio repetiu: Sorte!...sorte!...Sorte!...Sorte!...

- Você tem que pagar.

O papagaio repetiu: Pagar!...Pagar!...Pagar!...Pagar!...

- Eu não tenho dinheiro.

O papagaio repetiu: Dinheiro!...Dinheiro!...Dinheiro!...Dinheiro!...

Parecendo ser tocado por uma varinha mágica de uma fada o menino ficou apreciando a atitude de repetição do papagaio com um sorriso num semblante de felicidade e ao mesmo tempo decepcionado de não ter a oportunidade de prever a sua sorte. Então perguntou ao homem do realejo:

- Qual é o nome do seu papagaio?

- Vitor.

- Um nome legal! O nome do meu boneco será Vitor.

A menina de vestidinho de frutinha surpresa exclamou:

- Vitor!

E o papagaio repetiu: Vitor!...Vitor!...Vitor!...Vitor!....

A menina tirou um dinheiro do bolso e falou:

- Eu pago para ver a sorte dele, também quero ver a minha e se possível a do boneco também.

O papagaio repetiu: Sorte!...Sorte!...Sorte!...Sorte!...
O homem perguntou:

- Quem vai ser o primeiro?

A menina falou para o papagaio:

- Vitor! Capricha na minha sorte e ficou pertinho do papagaio falando com ele:

- Esse bilhete não Vitor! Como se ele entendesse o que ela falava trocando de papel.

- Esse também não Vitor! Ele ia para outro bilhete, então ela falou:

- Isso Vitor! Pega esse pra mim.

O papagaio deu o bilhete na mão do homem e voltou para a gaiola, então o homem falou para o papagaio:

- Você não tem educação! Vem carimbar o bilhete da mocinha para garantir que a sorte acontecerá. O papagaio carimbou furando o bilhete com o bico. – Mais um carimbo! Ele furou de novo e o homem entregou o bilhete para a menina que preferiu ler sozinha. Entre tantas coisas escritas no bilhete, uma chamou a atenção da menina e a deixou furiosa: “Um dia você encontrará um grande amor”. Ela olhou para o garoto e pensou: Eu não acredito no que está escrito aqui e correu para ver o que sairia no bilhete do garoto.

Ela abraçou o garoto que estava com o boneco nas costas, parecendo que o boneco estava mais ansioso que o garoto enquanto ele falava com o papagaio:

- Vitor! Vem pegar a minha sorte!

O papagaio repetia: Vitor!...Vitor!...Vitor!...Vitor!... E o garoto dava risada.

O papagaio chegou à porta da gaiola, pegou um bilhete e o menino falou:

- Carimba pra mim Vitor segurando o bilhete na mão! O papagaio carimbou furando o bilhete com o bico duas vezes e a menina falou:

- Deixe-me ler o seu bilhete! Pegando da mão do menino. Entre tantas coisas uma chamou a curiosidade da menina: “O amor caminha ao seu lado e está ao seu alcance”. O menino falou: - Eu acredito no que está escrito nesse bilhete.

A menina falou para o homem do realejo:

- O senhor não precisa tirar a sorte do boneco. Tira outro bilhete para mim que eu quero ter certeza da minha sorte e chamou o papagaio:

- Vitor! Vem pegar a minha sorte!

O papagaio repetiu: Sorte!...Sorte!...Sorte!...Sorte!... Depois saiu da gaiola e pegou outro bilhete para a garota, desta vez sem interferência dela. A menina esperou o Vitor carimbar o bilhete com duas bicadas e saiu para ler sozinha. Entre tantas coisas escritas, havia uma que não a deixou muito satisfeita: “O amor é como o sol, fica escondido atrás das nuvens e quando a gente menos espera, ele brilha aquecendo nosso corpo e satisfazendo os desejos da alma”. Ela teve uma sensação distante do amor e pensou: Eu não acredito no que está escrito nesse bilhete. Uma sensação de carência repentina percorreu o seu corpo e o seu coração, então ela correu e abraçou o menino por trás apertando-o com força e pedindo com carinho:

- Me deixa levar o Vitor um pouquinho! Pegou os comandos do boneco na mão e falou:

- Vem comigo! Eu quero que você conheça a minha casa e caminharam juntos saindo da praça, ouvindo a música do realejo cada vez mais distante, sumindo e desaparecendo com o passar do tempo.

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Paulo Ribeiro de Alvarenga

terça-feira, 19 de outubro de 2010

A menina de calcinha de frutinha


A menina de calcinha de frutinha

Pulando entre as pedras eu vou com minha perna de pau pisando em folhas secas pelos dias quentes de sol, assim sigo caminhando e ouvindo meus passos de perna de pau estalando as folhas: Ploc!...ploc...ploc...ploc... As folhas caem sobre mim, em minha frente, sobre tudo e enfeitam o caminho que vou passar.

Minhas mãos estão amarradas e meus pés também, mesmo assim continuo andando guiado pelas mãos hábeis de um menino sonhador, que me manuseia contando uma história criada e atuada em plena praça, assim sento nos bancos, subo nos muros e caminho seguido pelos olhos de pessoas curiosas querendo me pegar no colo.

Caminhando na história do garoto nunca imaginei que uma menina iria atuar também, porém o mundo improvisa a arte e a vida se encarrega de fornecer o cenário, então ela entrou na história com um lindo vestido amarelinho cheio de morangos vermelhos estampados. Ela perguntou para o garoto:

-Me deixa manusear o boneco de pau um pouquinho?

A partir daquele momento saí da história do garoto e caminhei na imaginação da menina de vestidinho amarelinho. Cautelosamente ela me levou em passos lentos até uma poça de água e o menino falou: Levanta os pés para não molhar Zip! A menina me levantou e pulamos a poça d’água. Então a menina falou:

- Me deixa levar o boneco para minha casa? Amanhã eu trago ele de volta para você.

- Não! Como saberei se você voltará com ele?

- Eu deixo uma coisa como garantia com você!

- Você deixaria o quê? Não vejo nada na sua mão!

- Me deixa pensar! Já sei! A menina tirou a calcinha por baixo do vestidinho amarelinho e deu na mão do menino como garantia.

Sem palavras o menino ficou olhando uma calcinha amarelinha com amoras pretinhas estampadas em sua mão, enquanto a menina levava o boneco de pau embora caminhando pela praça.

O menino enfiou a calcinha no bolso e pensou: E agora! O que eu faço?

A noite solitária foi longa e a dúvida se ela voltaria muito pior. Ele nem conseguiu dormir de tanto pensar.

Ele passou o dia seguinte inteiro na praça e nada da menina de calcinha de frutinha aparecer. Então ele resolveu procurá-la colocando cartazes nos postes, nas árvores e em todo lugar escrito assim:

“Preciso encontrar a menina de calcinha de frutinhas que está com meu boneco de pau. Se alguém souber onde ela está: Por favor! Avise-me.”

O menino passava dias sentado na praça com a calcinha no bolso à espera da menina. Às vezes ele a pegava na mão, olhava as estampas de amoras maduras, sentia sua maciez, cheirava pensando profundamente na tentativa de entender o que aconteceu.

O sol já havia se despedido do dia dando lugar à lua que trazia a noite cheia de brilho, quando ele avistou a menina entrando na praça manuseando seu boneco de pau, que caminhava sobre as folhas como se nada tivesse acontecido.
No momento que o boneco avistou o menino, caminhou rapidamente para os seus braços. Então a menina falou:

- Eu vim lhe entregar o seu boneco de pau! Ele já estava morrendo de saudades de você com cara de triste e se negando a obedecer aos meus movimentos. Olha como ele está feliz nos seus braços!

O menino agradeceu por ela ter trazido o boneco de volta, enfiou a mão no bolso pegando a calcinha de frutinhas e entregou para ela, que vestiu a calcinha na frente dele, provando a sua confiança nele quanto ao trato feito.

Os dois saíram manuseando o boneco que caminhava feliz enquanto o menino contava uma história de um príncipe e uma princesa procurando uma caixinha mágica do amor.
O boneco caminhava disfarçando enquanto eles brincavam felizes, pois percebera que eles já tinham achado a caixinha, abri-la seria apenas uma questão de tempo.

Paulo Ribeiro de Alvarenga
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